por Beatriz Berkowitz

(Publicado no Caderno Saúde do Jornal Minuano, Bagé, RS, Brasil, em Abril de 2016)

 

No início do mês de abril tive a oportunidade especial de ter sido convidada por minha família  para um debate sobre a violência, na Prefeitura de Bagé. Para minha surpresa, o que me parecia ser um casual e corriqueiro convite, já que aqui estou de passada, visitando a família, tornou-se um importante encontro, onde muitos segmentos da sociedade bajeense ali estavam representados.

Foi muito interessante perceber como cada representante da sociedade apresentava a problemática da violência e como os diferentes pontos de vista no final chegavam a um mesmo denominador comum, embora apresentados de variadas maneiras e, mesmo o que parecia contraditório, no final encontrava em sua raiz a mesma essência, ou seja, a dialética humana e sua natureza social e divina.

Muitos jovens e estudantes de direito também estavam presentes e o questionamento sobre os direitos humanos foi bastante enfatizado.

A questão da ecologia teve sua vez, abordando aspectos como a influência da mídia sobre o comportamento humano e de que forma podemos atuar nesse sentido para termos uma sociedade mais saudável e em contrapartida, indivíduos mais integrados, o que significa com menos pro- pensão à violência seja ela a nível físico, emocional, mental, ambiental, etc.

Num certo momento do debate percebi que poderia contribuir com meu depoimento, pois eram abordados aspectos da problemática sobre a violência que a mim eram muito familiares, em- bora o cenário de minha vivência e trabalho fosse outro, em outro hemisfério, no Hemisfério Norte, pois moro nos Estados Unidos da América.

Assim, podemos perceber que mudamos de lugar, mas os problemas são praticamente os mesmos; muda o cenário, mas a problemática a se desenrolar é a mesma; mudam os vestuários e a forma de viver; muda a cultura; a língua, mas o que se fala é o mesmo. O sofrimento é o mesmo, as dificuldades são as mesmas, a procura por soluções é a mesma.

Por que isso se dá dessa maneira? Seriam as soluções também as mesmas?

Desde que o mundo é mundo, fala a história e questiona a filosofia: “quem é o ser humano?” Já dizia Sócrates na antiga Grécia: “conhece-te a ti mesmo.” Ou mesmo o mestre Jesus: “a verdade te libertará.”

Ao que tudo indica, a problemática humana permanecerá até que todas essas perguntas encontrem a resposta dentro do coração de todos e apresente à humanidade uma nova vida – a vida filosófica, a vida baseada nos valores mais intrínsecos do ser humano; uma vida onde o amor e a fraternidade possam reinar.

Por isso, talvez, as soluções de um hemisfério possam ser úteis em outro hemisfério. Afinal, a humanidade é a mesma. Assim como a filosofia é atemporal.

Foi refletindo sobre isso que decidi compartilhar sobre o trabalho que eu e meu esposo, Alan Berkowitz, entre outros, fazemos nos Estados Unidos. E falar sobre dois tipos de abordagens que lá usamos para lidar com a problemática da violência, as quais são usadas com sucesso também em outros países, como na Nova Zelândia e Europa. São elas a “Norma Social” e a posição do “Observador Passivo” ou “Bystander”.

Tais abordagens podem ser usadas em qualquer tipo de violência ou abuso e comportamentos inadequados, bem como injustiça social. São simples de serem aplicadas, qualquer pessoa pode ser treinada para executá-las, e os resultados são estatisticamente positivos.

A “Norma Social” diz que um comportamento socialmente inadequado poderá ser corrigido no momento em que se mostra estatisticamente a verdade, o que vem a demonstrar ser falha a nossa percepção dos fatos da vida. Assim sendo, por exemplo - o índice do uso de álcool nas universidades americanas sofreu uma diminuição considerável quando demonstrado que erroneamente a minoria dos estudantes, que eram os que bebiam e causavam problemas, pensavam que fossem a maioria, enquanto a maioria (dos estudantes), que eram os que não bebiam ou que ao beberem não causavam problemas, pensavam ser uma minoria. Portanto, ao ser corrigida a percepção errada, constatando então que a maioria não bebia ou ao beber não causavam problemas, foi possível diminuir consideravelmente o índice de abuso de álcool em tais universidades. O mesmo tem ocorrido em violência doméstica, abuso sexual, abuso aos idosos e mesmo na ecologia.

O “Observador Passivo” é aquela posição que a maioria das pessoas assume na vida cotidiana, de não fazer nada frente a uma situação social in- justa ou mesmo naquela em que uma pessoa está correndo risco de vida ou em perigo, mesmo que- rendo fazer o certo. Pois foi provado “que toda a pessoa quer fazer a coisa certa”. Platão falava disso. Ele se referia ao aspecto do bom, todos temos essa essência do bem.

A pergunta então é: por que o ser humano não faz nada, ou seja, não intervém quando vê ocorrerem fatos como esses? Por que ele se torna um observador passivo, podendo ser um agente ativo da sociedade, capaz de mudar, não só o evento, mas o mundo?

 

Descobriu-se várias razões para isso, entre elas:

  1. a influência social – onde assumimos que isto não é um problema, uma vez que outros não intervêm.
  2. inibição - medo de ficar constrangido frente aos
  3. difusão de responsabilidade – quando pensamos que um outro fará
  4. a norma social – quando acreditamos que é normal, que aquilo é a norma social, uma vez que ninguém faz nada, o que denota que não incomoda a ninguém aquele
  5. medo de ser retaliado, de ser afetado pelas negatividades.

 

Essas abordagens têm sido usadas em nossa prática nos Estados Unidos, bem como no Canadá. Temos levado esse ensinamento a outros e compartilhado os resultados. Espero que seja útil para você também.

Finalizando, queríamos dizer que mais do que resultados, em nossa vivência, aprendemos também que o verdadeiro caminho é um caminho com o coração e um caminho com o coração é um caminho com sabedoria, e que com a sabedoria como guia podemos ser agentes ativos da sociedade, podendo passar da posição do observador passivo ao agente transformador, em prol de uma sociedade mais justa.

Não poderemos transformar o mundo sem antes transformarmos a nós mesmos, e, enquanto não nos vermos como parte do problema, não poderemos ser parte da solução, sendo o amor a força motriz para isso, amor este que pertence a todos nós como herdeiros divinos que somos.

Ao sabemos que outros também pensam como nós, que somos uma maioria, mais fácil se torna agirmos corretamente.

 

Seja você mesmo! Trabalhe pela paz!